19h:55 – Avenida de uma grande cidade.
No carro, um casal conversa sobre um bárbaro crime cometido contra um jovem de 21 anos.
De repente, disparos, muitos, bem a frente dos dois. Na faixa contrária da rua, uma moto parada e dois homens, um deles aponta um revólver calibre 38 em direção a um cidadão que parecia querer atravessar a via. Não deu tempo, os disparos foram à queima roupa, rápidos, certeiros. O corpo, que há tão pouco tinha tanta vida, cai, desaba sobre o asfalto frio.
Do carro, a moça pode ver todos os detalhes. O fogo da pólvora disparada, na “boca” da arma, as mãos firmes de um assassino, a frieza do piloto da moto, o corpo caindo, meio em câmera lenta, meio despencando em sua frente. Sente, como a batida do coração, o freio do carro, o desvio da direção para não atropelar aquela pessoa baleada e o som dos disparos, que continuam. Olha para frente, enxerga pista livre e grita “Amor, acelera!”.
Ainda sem conseguir pensar, a moça pega o telefone e liga para o 190 relatando tudo o que aconteceu. Quando pensou que teria que esperar minutos longos, alguém atendeu e ela relatou tudo o que presenciara. Exatos onze minutos depois alguém que se identificou como tenente do corpo de bombeiros ligou para confirmar o fato e a exata localização para enviar o socorro. Novos relatos e um choro compulsivo.
Afinal, que diabos de cidade é essa em que uma pessoa sai do trabalho e dá de cara com um assassinato? Assim, simples, normal, corriqueiro?!? Qual a possibilidade de alguém presenciar alguém matando... alguém? Acreditem, é algo totalmente irreal, inenarrável, assustador, chocante, revoltante... Diferente de tudo o que se possa ser dito ou visto. O cinema é ficção, as fotos dos jornais ou imagens da tv têm o verbo no passado, “morreu”, “foi assassinado”. Diferente é esse verbo no presente, é estar na cena do crime.
A pessoa que vi ser assassinada, na Avenida Norte, Recife, na segunda feira, 20 de novembro de 2006, era comerciante, tinha 36 anos e se chamava Luiz Antônio do Nascimento. Ele ainda chegou a ser socorrido para o Hospital da Restauração, mas não resistiu e morreu.Infelizmente não faço idéia de quem foram seus assassinos, nem o motivo (se é que se existe motivo pra isso) do crime. Mas sei que a violência chegou a tal ponto que é impossível continuarmos, como ouvi tanto essa semana, dizendo “é assim mesmo”, “acontece toda hora”, “não podemos fazer nada”.
Infelizmente, esse é um relato real. Eu e Adônis saímos, graça a Deus, ilesos dessa. E estamos nos esforçando para apagar a cena da cabeça e continuar a ter uma vida “normal”.